Capa Artigo Dr Dimas
Tipo:
Artigo
Data de Publicação:
Ementa / Resumo:

Controle Externo Preventivo
Exame Prévio de Edital permite que Tribunal de Contas atue antes de falhas e fraudes em licitações

*Dimas Ramalho
Conselheiro do Tribunal de Contas do Estado de São Paulo

Uma das principais atividades dos Tribunais de Contas no controle externo da Administração Pública consiste em analisar o cumprimento de regras e princípios que regem os contratos firmados pelos órgãos estatais. Em que pese o trabalho pedagógico voltado à orientação dos jurisdicionados, é notória a repetição de falhas, graves ou banais. Além de frequentes, esses vícios que levam à reprovação dos ajustes também chamam a atenção por se concentrarem, muitas vezes, nos editais das licitações.

Durante a fase de planejamento da licitação, que precede a elaboração do edital, a Administração precisa mensurar suas necessidades, qualitativa e quantitativamente, fazer pesquisas de mercado, verificar a existência de disponibilidade orçamentária para a despesa e formular os requisitos de participação e as condições de habilitação. Toda a engenharia da contratação é estruturada nessa etapa inicial e dela deve resultar o acervo técnico, jurídico e econômico que orientará a elaboração das regras da disputa.

O edital, por sua vez, deve ser claro na definição do serviço ou bem a ser adquirido, dispor de regras favoráveis à ampla competitividade, simplificar o quanto possível os ônus para a participação no certame e estabelecer exigências de habilitação compatíveis com o objeto, materializando as diretrizes do inciso XXI do artigo 37 da Constituição da República.

Como se percebe, o edital é um documento central tanto para a condução do certame quanto para a execução do futuro contrato. Portanto, é essencial a existência de um instrumento de controle externo preventivo, que possa averiguar a regularidade das disposições do instrumento convocatório. Essa finalidade é cumprida pelo Tribunal de Contas do Estado de São Paulo no sistema de Exame Prévio de Edital (art. 220 do RITCESP), ao exercer competência que lhe foi atribuída pela Lei de Licitações, ainda na década de 1990 (art. 113, §1º, da Lei n. 8.666/1993).

Os processos de Exame Prévio de Edital têm origem principalmente em representações realizadas por cidadãos comuns, advogados ou empresas interessadas no processo licitatório, em um procedimento totalmente público e transparente. Uma cópia do edital da licitação já publicado também pode ser requisitada pelo Tribunal para análise de ofício, ou seja, sem que ninguém tenha impugnado o instrumento convocatório.

Em ambos os casos, essa requisição pode ser feita até a véspera do recebimento das propostas, com o objetivo de analisar a legalidade do edital e, se for o caso, determinar liminarmente a suspensão do certame. Ao julgar o mérito, o Pleno pode anular o edital, se os problemas exigirem um retorno à fase preparatória da licitação, ou impor medidas corretivas para que a Administração dê continuidade ao procedimento já iniciado. Além disso, se for verificado eventual dolo e a pretensão de se manipular as regras da disputa com a finalidade de impor restritividade ou permitir o favorecimento de determinados fornecedores, o Tribunal pode remeter os autos ao Ministério Público para apuração de eventuais atos de improbidade administrativa ou crimes.

O Exame Prévio de Edital possui rito especial e sumaríssimo, com tramitação de urgência, em meio eletrônico, para que nenhum serviço essencial atrase ou seja interrompido pela atividade de controle externo. O foco da instrução processual reside na identificação de omissões e inconsistências graves, requisições excessivas, injustificadas ou desnecessárias com potencial para restringir a participação e a ampla competitividade do certame, ou que dificultem e inviabilizem a formulação de propostas, comprometendo as condições para a obtenção da proposta mais vantajosa.

A prática demonstra que as irregularidades mais comuns dizem respeito (1) à condição estrutural da licitação (modalidade licitatória, tipo de licitação, rito procedimental do certame), (2) à definição e formatação do objeto (excessos ou falhas nas especificações, formação de lotes sem atenção à natureza ou origem comum dos componentes, aglutinação irregular), (3) às condições gerais de participação (consórcios, cooperativas, empresas apenadas com suspensão/impedimento, empresas sob recuperação judicial), (4) aos requisitos de habilitação, (5) aos critérios de análise e julgamento das propostas (laudos, certificações, amostras, orçamento estimativo), (6) bem como às condições de fornecimento e/ou prestação dos serviços (prazos de entrega ou início dos serviços, rede credenciada, subcontratação). 

Apenas no primeiro trimestre de 2021, o Plenário do Tribunal de Contas do Estado de São Paulo analisou 407 processos pelo sistema de Exame Prévio de Edital. Isso demonstra a importância estratégica e a dimensão tomada por esse procedimento, que permite ao controle externo antecipar-se e contribuir para elevar a eficiência da Administração Pública, evitando direcionamentos e equívocos danosos ao erário.