As práticas ESG e a Gestão Pública
As práticas ESG e a Gestão Pública
* José Paulo Nardone
Este escrito trata desta atualíssima agenda denominada ESG (Environmental, Social and Governance) – ou, em português, Ambiental, Social e Governança –, em que buscaremos tratar da importância e do estágio atual em que se encontra a adoção das práticas ESG pelas organizações privadas e órgãos públicos, detalhando aspectos que envolvem tal mudança de conduta e os benefícios a partir da introdução das referidas práticas.
Fato incontestável é que a adoção de práticas ESG se tornou um diferencial no mercado privado, com importantes mudanças no padrão de consumo, já que os consumidores querem conhecer a origem do produto, as condições de sua produção, a gestão de resíduos, de embalagens; nas opções de trabalho, pois os novos talentos buscam conhecer não apenas a remuneração oferecida, mas especialmente as políticas de RH das empresas; e quanto aos investidores, estes têm indicado que o alinhamento de práticas sustentáveis tornou-se um critério, uma nova tendência facilitadora da obtenção de recursos – a financiabilidade.
Aqui vale a lembrança sobre os recentes desdobramentos do novo Marco Regulatório do Saneamento Básico no Brasil, em que processos de concessão do abastecimento de água e tratamento de esgoto pelos Estados culminaram em sucessivas transferências de tais serviços à iniciativa privada, movimentando valores elevadíssimos – sinais evidentes da larga oferta de recursos para o financiamento de ações públicas voltadas para a agenda ESG.
Tantas mudanças no ambiente econômico-corporativo se transportam também para a gestão pública, na medida em que conceitos como “Estado Verde” ou “Cidades Sustentáveis” passam a ser perseguidos pelos gestores públicos, já que o “cliente” dos serviços públicos, ou seja, o cidadão, também tem se posicionado valorizando práticas sustentáveis na oferta dos produtos do aparelho estatal, seja na infraestrutura das cidades, nas condições de acessibilidade, diversidade, inclusão, igualdade de acesso às políticas públicas, na transparência e publicização dos atos, no comprometimento com a conservação ambiental, entre outros.
Medidas relacionadas aos critérios ESG na seara pública são ações reguladoras e também executoras, voltadas à redução do desmatamento e restauração ecológica; licitações de concessões de rodovias sob condições de redução de emissão de carbono; eliminação de processos físicos com utilização de papel; licitações para compras de suprimentos a partir da qualificação/certificação de fornecedores conforme parâmetros sustentáveis; investimento em energias renováveis e maior transparência de atos de gestão, demonstram que se a jornada ESG é uma ação coletiva, os governos não podem deixar de participar ativamente.
São muitas as iniciativas já adotadas no cenário nacional, mas maiores ainda são as oportunidades. Vejamos dados relacionados ainda à questão da infraestrutura de saneamento básico, em que estudos indicam que nada menos do que 47% da água tratada nos 405 maiores municípios brasileiros se perde antes de chegar às torneiras das famílias, ao passo que, antagonicamente, mais de 100 milhões de pessoas no Brasil se ressentem da falta de água tratada – isso em se tratando apenas do aspecto ambiental.
O que dizer dos demais eixos ou ambientes do desenvolvimento sustentável: o social, com políticas públicas eficientes, efetivas, inclusivas e aderentes às necessidades dos usuários; o ambiente da governança pública, com definição de metas parametrizáveis e comparáveis, permitindo mensuração e acompanhamento dos resultados, transparência, ética e publicização dos resultados para monitoramento pelos órgãos de controle e pelos usuários dos serviços públicos.
Enquanto no mundo corporativo estudos da McKinsey indicam que as organizações que investem na questão da diversidade têm retorno financeiro 35% maior que a média do mercado, pesquisa da Forbes indica que, além da diversidade, ações voltadas ao compliance e a melhores práticas internas e à transparência impactam positivamente na imagem e nos resultados das instituições que as adotam.
Há muito o que fazer, especialmente em relação ao planejamento e à execução das políticas públicas, mas o que se mostra como indiscutível é que esta nova consciência veio para mudar a sociedade por completo – os consumidores, investidores e eleitores, todos estão muito mais atentos às questões enfrentadas pelas práticas ESG, criando uma agenda consistente, motivando a criação de ações e o aperfeiçoamento daquilo que já é feito por meio das políticas públicas.
Neste passo, resta patente que o Estado regulador, executor e controlador precisa se movimentar em direção aos novos anseios sociais. Aqui é necessário que se faça o registro de que muitas medidas já se efetivam, pois uma simples ação de combate ao desperdício pode ser encarada como uma prática de sustentabilidade; entretanto, o que se verifica em muitas situações é a falta de sinergia num conjunto de ações isoladas e desconectadas, que num contexto de consciência e esclarecimento deveriam ser indicadas como parcelas de um movimento coordenado de práticas sustentáveis.
A valorização de tais ações pela sociedade é inegável e a necessidade de os gestores se atentarem para isso é premente. No campo do controle, a atuação do Tribunal de Contas do Estado de São Paulo em adotar há alguns anos medidas de controle e de acompanhamento da implementação dos ODS pelos municípios e governo estadual se mostra emblemática, dada a conhecida e reconhecida atuação reativa dos gestores, que apenas após ação do TCESP é que buscam se ajustar às insuficiências. Tal conduta, embora não seja a ideal, tem contribuído com o avanço de tais medidas entre nós.
Enfim, diante de tantos fatos e expectativas em torno da matéria, mostra-se evidente o momento histórico em que nos encontramos, no qual uma jornada conjunta e coordenada de todos os campos da vida social não deve ser adiada ou postergada, mas imediatamente adotada e consubstanciada em medidas efetivas, sob pena de se mostrar tardia, irremediável e trágica.
A consciência é o primeiro estágio para a mudança de atitude.
* José Paulo Nardone é Diretor-Técnico da Unidade Regional do TCESP em Bauru (UR-02), Professor universitário e Mestre em Direito do Estado.
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