*José Paulo Nardone 

Parafraseando Peter Drucker, “não há nada tão inútil quanto fazer com grande eficiência algo que não deveria ser feito”, nota-se que esta expressão parece ter sido concebida sob medida para uma cultura de construção de políticas públicas, especialmente no âmbito municipal, que infelizmente nem sempre se sustenta a partir de um processo de identificação de problemas e definição de prioridades, da análise técnica de alternativas a sustentar a tomada de decisão pelo dirigente público, tudo consubstanciado na construção de um desenho lógico estrutural que indique de que forma recursos se reverterão em resultados pretendidos, sob a égide da institucionalização formal de todo o processo.

No trecho acima estão sinteticamente lançadas as fases que tecnicamente compõem a formulação de políticas públicas, este, apenas o primeiro estágio do seu ciclo, composto também pelas etapas de implementação e de avaliação.

No plano da construção de políticas públicas, infelizmente somos obrigados a reconhecer que há situações nas quais o gestor pura e simplesmente “quer fazer”. Independentemente de base técnica, ele quer fazer um estádio, uma ciclovia, um VLT, uma creche, mesmo inexistindo déficit de vagas, uma nova unidade hospitalar, ainda que não tenha margem para investimentos em equipamentos ou para contratações de profissionais de saúde.

De início, especialmente em ano de eleições municipais, importante destacar que a legitimidade conferida por uma eleição não se consubstancia numa “carta branca” ao gestor, a chancelar o desperdício de recursos públicos com iniciativas sem qualquer suporte técnico que lhe empreste um mínimo de aceitabilidade. É necessário profissionalizar a gestão pública e, para tanto, racionalizar a construção de políticas públicas de qualidade é um requisito indispensável.

Portanto, o primeiro passo nessa direção é diagnosticar o problema, detalhando uma insuficiência decorrente do cotejo entre a realidade posta e a situação desejada, o que passa a caracterizar um problema social e dentre tantos outros que nos cercam e afetam, deverá o gestor formar a sua agenda reunindo aqueles prioritários, numa decisão política, é verdade, mas pautada a partir de avaliação que leve em consideração os custos envolvidos, a existência de recursos suficientes a fazer frente à solução pretendida, a identificação do grupo social destinatário daquela ação pública, preferencialmente os mais vulneráveis, dentro de um processo transparente de escolha, que permita tanto a participação popular, quanto o exercício de ações do controle. Assim, estará adequadamente delimitada a necessidade a ser enfrentada por uma ação pública.

Definida a agenda, a boa técnica de formulação de políticas públicas nos encaminha para a análise de alternativas de solução, a partir daquilo que se denomina “Análise do Impacto Regulatório”, que nada mais é do que o procedimento pelo qual se estabelece os insumos necessários, o seu custo, qual o impacto da ação governamental para o público-alvo, consideradas evidências e indicadores, buscando oferecer uma base de dados objetiva a auxiliar na tomada de decisão a partir da comparação entre as alternativas, inclusive da opção de não intervenção, também chamada contrafactual, afinal,  pode-se concluir que a melhor alternativa em preciso momento, seja aquela de não atuar.

Nesta etapa da formulação das políticas públicas, o que se espera é uma racionalização do processo decisório, otimizando a utilização de recursos públicos, evitando desperdícios, assim com a fragmentação, duplicidade e sobreposição de iniciativas.

Neste desenho do processo de planejamento e formulação de políticas públicas, deverão ser estabelecidos objetivos e metas mensuráveis a serem alcançados num prazo determinado, a fim de viabilizar o monitoramento e a avaliação das ações e programas que constituam o processo, inclusive estabelecendo a frequência de sua verificação.

O capítulo final do processo de formulação de políticas públicas é a sua institucionalização, representada pela oficialização e regulamentação por meio de ato normativo apropriado, tornando público e oficial o plano, o programa ou o projeto, inclusive integrando o PPA (lembrando que 2025 é ano de sua elaboração), acompanhado da devida transparência, a permitir a avaliação e o acompanhamento pela sociedade e pelos órgãos de controle.
 
Essas etapas são propostas dentro de um modelo didático de apresentação e sequenciamento, mas de forma alguma constituem-se em fases estanques ou compartimentadas, mas ao contrário, elas se interpenetram, permeiam-se e se relacionam, dando margem à ação de monitoramento, controle e aprimoramento, tanto pelo próprio executivo que propõe a solução de intervenção pública, quanto pelos órgãos de controle externo.

E aqui fica a lembrança, o bom controle é aquele que se realiza na concomitância da construção das políticas públicas, este controle que monitora e acompanha essa estruturação desde a sua formulação, é o mesmo que contribui para otimizar os recursos aplicados, evitando desperdícios e por isso mesmo zelando pela eficiência do processo.

Da mesma forma que acompanha a entrega ou não dos produtos projetados dentro dos prazos pré-determinados, avaliando a eficácia do programa ou ação e, por fim, não deixa de verificar a sua efetividade, na medida em que, ao longo da sua atuação, checa quais os impactos produzidos ou não pela política pública junto à realidade social.

Enfim, da mesma forma que uma política pública começa a alcançar o sucesso esperado a partir de uma adequada construção, também o controle encontrará seus melhores resultados se for aplicado desde a fase de formulação das políticas, atuando no sentido de prescrever eventuais reparos logo no início da rota, com tempo suficiente para que os gestores possam empreender mudanças e correções de rumo.

Apenas um controle preventivo, simultâneo e proativo é que poderá entregar uma efetiva e consistente contribuição, “ex ante”, para o sucesso e a boa condução das ações do poder público com vistas a solucionar questões sociais relevantes, este o objetivo central de qualquer atuação do aparelho estatal.

*José Paulo Nardone é Diretor Regional da Unidade Regional do TCESP em Bauru, Mestre em Direito do Estado e Professor Universitário.
 

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