*Fernanda Borges Keid

A importância de se pensar em saúde mental de forma estratégica transcende a mera preocupação com o bem-estar individual. Trata-se de uma questão de sobrevivência e prosperidade organizacional. Quando uma instituição se compromete a cuidar da saúde mental de seus colaboradores, ela está, na verdade, investindo em sua própria longevidade e resiliência. A mente humana, com toda a sua complexidade e profundidade, é o motor que impulsiona a inovação, a criatividade e a produtividade. Ignorar esse aspecto é como negligenciar a manutenção de uma máquina vital, condenando-a ao desgaste prematuro e ao perecimento.

A saúde mental, quando tratada com a devida seriedade, pode transformar o ambiente de trabalho em um santuário de crescimento e desenvolvimento. Imagine um espaço onde cada indivíduo se sente valorizado, compreendido e apoiado. Esse ambiente não apenas reduz o estresse e a ansiedade, mas também fomenta um senso de pertencimento e propósito. A empatia e a compreensão se tornam a moeda corrente e, por conseguinte, a colaboração floresce. Em um cenário assim, os colaboradores não são meros executores de tarefas, mas sim cocriadores de um futuro compartilhado. A energia positiva gerada por um ambiente mentalmente saudável reverbera em todas as direções, criando um ciclo virtuoso de bem-estar e produtividade.

Esse ciclo virtuoso é, em essência, a base da sustentabilidade social, onde o bem-estar coletivo é promovido e mantido ao longo do tempo. A sustentabilidade social, portanto, possui relação com a forma pela qual as instituições tratam a saúde mental e o bem-estar de seus colaboradores, componentes essenciais para garantir um ambiente de trabalho mais justo, seguro e inclusivo.

Por outro lado, a negligência da saúde mental pode ter consequências devastadoras. O estigma associado aos transtornos mentais, a falta de apoio e a pressão incessante podem levar a um aumento alarmante de absenteísmo, presenteísmo e rotatividade. O custo humano é imensurável, mas o impacto organizacional também é significativo. A dor e o sofrimento silenciosos de colaboradores desamparados corroem a alma da organização, minando sua capacidade de inovar e prosperar.

Portanto, pensar em saúde mental de forma estratégica é um ato de coragem e visão. É reconhecer que o verdadeiro capital de uma organização reside em suas pessoas e que seu bem-estar mental é a chave para desbloquear todo o seu potencial. É um compromisso com a criação de um futuro em que o trabalho não seja uma fonte de sofrimento, mas sim um catalisador de realização e crescimento. Ao priorizar a saúde mental, as organizações não apenas se alinham com os valores humanos mais profundos, mas também se posicionam para enfrentar os desafios do século XXI com força, resiliência e compaixão.

Às vésperas do mês dedicado à conscientização sobre a prevenção do suicídio, diante de tantas campanhas midiáticas em torno do assunto, é um momento em que estamos mais sensíveis à reflexão do tema. No entanto, é crucial que esse tópico seja permanentemente pensado como forma de gestão que assegure a sustentabilidade social das organizações.

Dessa forma, para que haja verdadeiramente a sustentabilidade social, uma instituição deve caminhar para além das aparências e adotar medidas concretas que promovam um ambiente de trabalho saudável e seguro. Isso inclui a implementação de políticas e práticas que combatam o assédio moral, sexual e a discriminação, e que ofereçam suporte psicológico e emocional aos seus colaboradores.

Nesse compasso, a Resolução nº 11/2024, de 22/05/2024, do Tribunal de Contas do Estado de São Paulo (TCESP), instituiu o Núcleo de Acolhimento, que representa um exemplo claro de como a promoção da saúde mental pode ser integrada às práticas estratégicas organizacionais para garantia de um ambiente de trabalho mais saudável e sustentável.

Em um mundo em que o carewashing (a prática de aparentar preocupação com o bem-estar e a saúde mental dos trabalhadores sem implementar mudanças reais e efetivas) se torna cada vez mais comum, a instituição de um Núcleo de Acolhimento no TCESP surge como um farol de esperança e autenticidade, que representa um compromisso genuíno e transformador com a promoção da saúde mental e do bem-estar dos colaboradores da instituição.

A criação deste espaço está profundamente alinhada com a missão, visão e valores do TCESP, bem como com os princípios fundamentais da Constituição Federal, que preconiza a igualdade e a proteção dos direitos humanos. A resolução também se fundamenta em diversas legislações e convenções internacionais que visam eliminar a discriminação e promover um ambiente de trabalho seguro e saudável.

Destarte, a correlação entre a decisão pela implementação do núcleo e a preocupação do TCESP com a sustentabilidade social é direta e profunda, uma vez que demonstra que órgão segue o entendimento de que a saúde mental é influenciada por uma série de fatores biológicos, psicológicos e sociais, e o ambiente de trabalho desempenha um papel crucial nesse contexto.

Outrossim, a presença de um núcleo dedicado ao acolhimento e ao suporte psicológico e emocional pode mitigar os efeitos aniquiladores de situações de assédio e discriminação, que são reconhecidamente prejudiciais à saúde mental.

Cabe destacar que o núcleo foi idealizado de modo a oferecer um espaço seguro para escuta e orientação, promovendo uma atenção humanizada e centrada nas necessidades individuais. Este enfoque respeita o tempo de reflexão e decisão das pessoas, fortalecendo sua integridade psíquica, autonomia e liberdade de escolha. A confidencialidade e o sigilo nos atendimentos são garantias essenciais que incentivam os servidores a buscarem ajuda, sem medo de estigmatizações ou exposições negativas.

Ainda, a capacitação contínua dos integrantes do núcleo é outro aspecto crucial. A formação adequada permite que esses profissionais estejam preparados para lidar com as complexidades das situações apresentadas, oferecendo um suporte qualificado e eficaz. A multidisciplinaridade do núcleo, que inclui psicólogos, assistentes sociais, fisioterapeutas e outros profissionais capacitados, assegura uma abordagem holística e integrada ao cuidado com a saúde mental.

Logo, a sustentabilidade social é um compromisso que vai além de políticas internas superficiais e, assim, o Núcleo de Acolhimento, que completa quatro meses de existência no próximo Setembro Amarelo, acompanhado por outras importantes iniciativas internas que vêm sendo idealizadas e desenvolvidas, mantém o Tribunal de Contas do Estado de São Paulo como órgão vanguardista na adoção de uma política estratégica clara em relação à saúde mental de seus colaboradores e, por conseguinte, à própria sustentabilidade social da organização.

*Fernanda Borges Keid é Diretora da Diretoria de Saúde e Assistência Social (DASAS) do Tribunal de Contas do Estado de São Paulo (TCESP)

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